Domingo à noite, momento para relaxar, sentar no sofá e ver um bom filme com a família. Porém o sinal do pacote da TV por assinatura não estava bom, e como eu não assino nenhum sistema de streaming, a solução é recorrer aos bons e velhos DVDs. Felizmente tenho uma coleção invejável. Nesta ocasião o escolhido foi O Chamado (2002), filme que marcou uma geração e já completa 17 anos. Hora de pôr a regra dos quinze anos à prova.
Espalhou-se um boato sobre uma fita de vídeo que, de forma sobrenatural, mata após sete dias aquele que a assistir. Quatro jovens são mortos misteriosamente no mesmo horário e por circunstâncias estranhas, acredita-se que as mortes estejam ligadas ao objeto e seu conteúdo, o que leva a repórter Rachel Keller (Naomi Watts) a investigar o caso, pois uma das vítimas era sua sobrinha. Em sua investigação, Rachel encontra a tal fita e a assiste, se a lenda for verdadeira, Rachel tem apenas sete dias de vida, e deverá usá-los para investigar este mistério.
Este filme me marcou bastante quando o vi pela primeira vez no cinema, tive medo de morrer uma semana depois, tive medo de dormir em frente à televisão, mas depois que o prazo passou e eu continuava vivo, já fiquei mais aliviado. E quando o filme chegou às locadoras, reuni meus primos para assistirmos juntos, sem adultos, com as luzes desligadas, e coincidentemente o telefone tocou após o filme terminar, e todos nós nos cagamos de medo.
Uma outra era, uma outra tecnologia
Antes de aprofundar no filme, é válido conhecermos um pouco o contexto da época em que este foi lançado. 2002 era um ano de transição, em que novas tecnologias apareciam no mercado sem necessariamente tornar outras obsoletas. Os DVDs estavam chegando timidamente para substituir as fitas VHS, e no Brasil os filmes em formatos digitais (Divix) já eram vendidos ilegalmente nas esquinas; as câmeras digitais da mesma forma chegavam para substituir as câmeras analógicas; e no campo dos aparelhos celulares, os “tijolões” dividiam espaço com modelos mais modernos, os celulares de abrir e fechar.
Abordei brevemente a chegada dos VHS em meu texto sobre Despertando A Bela Adormecida (2009). Em resumo, o videocassete era um aparelho que permitia a gravação de imagens registradas em fitas, as VHS (abreviatura de Video Home System, ou Sistema Doméstico de Vídeo), e reproduzi-as na televisão. Este aparelho começou a se popularizar a partir do momento em que as distribuidoras olharam para o horizonte e viram o mercado do home vídeo. Com isso, passaram a lançar e distribuir seu catálogo de filmes neste novo formato acessível para todos, em meados dos anos 1980.
A popularidade deste formato contribuiu para o surgimento das vídeo-locadoras, um estabelecimento que reunia um catálogo de filmes em VHS, onde o cliente poderia alugar um filme, assistir em sua casa e devolvê-lo no dia especificado (sem esquecer de rebobinar para não pagar uma multa). Esta era uma boa opção de lazer para pessoas mais caseiras, ou cinéfilos, reunir os amigos para ver um lançamento aguardado ou uma pilha de filmes do catálogo.
A partir de 1999 e 2000, os DVDs começaram a se introduzir no mercado. Normalmente a substituição de uma mídia para outra seria lenta, mas como a tecnologia avança a passos largos, esse processo demorou no máximo 8 anos para alcançar este objetivo. Tenho em minha memória que o último filme que chegou no formato VHS na locadora que eu frequentava foi O Chamado 2 (2006), e como o mesmo também foi lançado no formato DVD, a fita foi esnobada. Já em 2002 quando o filme anterior foi lançado, as fitas VHS estavam apenas no início da queda.
Particularmente, eu possuía O Chamado no formato Divx baixado da Internet enquanto o filme ainda estava nos cinemas, que eu mesmo legendei (levei uns 6 meses). Depois o adquiri em VHS (uma cópia que eu mesmo pirateara) e só em 2005 tive acesso ao filme em formato DVD (original, para variar).
O terror tecnológico em O Chamado
Como mencionei anteriormente, em 2002 as câmeras fotográficas também estavam passando por um processo de transição. As pessoas ainda tinham suas câmeras analógicas e, ao mesmo tempo, aqueles com poder aquisitivo maior podiam comprar uma câmera digital. Minha família só teve condições de comprar uma câmera digital em 2005, a última vez que comprei um rolo de filme foi em 2007, e tive dificuldades em encontrar.
Em O Chamado vemos essas duas tecnologias em contraste. A primeira pista que Rachel segue é um ticket para buscar umas revelações de fotos que sua sobrinha e amigos haviam tirado. Para aqueles que não passaram por esta experiência, com as câmeras analógicas você comprava um filme de 24 ou 36 fotos e depois de tirar este número de fotografias levava o filme para um laboratório de revelação (ou ampliação). Só então você saberia como as fotos ficaram. Normalmente as imagens saiam tremidas, com um dedo na lente, as pessoas saiam com os olhos fechados, fazendo careta involuntariamente. A surpresa estava reservada para o dia em que você buscava as fotos no laboratório.
Como Katie e os amigos utilizaram uma câmera analógica para fotografar a esmo o final de semana no Mountain Shelter Inn, não tinham noção de que seus rostos sairiam borrados nas fotografias após terem assistido à fita, só saberiam disso quando tivessem as fotos já reveladas. Para Noah – o cara de maior poder aquisitivo que mencionei anteriormente, que possui uma (várias) câmera(s) digital(is), afinal é o seu trabalho – é graças à comodidade de poder ver a foto instantaneamente em sua câmera digital que o mesmo passa a acreditar na maldição que caíra sobre ele.
A forma de fazer pesquisas também estava em processo de evolução em 2002, e O Chamado apresenta bem este contraste. Rachel investiga o caso em diversas fontes: começa com o depoimento e testemunho de pessoas, depois parte para os livros na biblioteca, em arquivos de jornal, e por último na internet.
Hoje em dia é impensável realizar uma pesquisa sem utilizar a Internet como fonte principal, ou pelo menos como ponto de partida. Mas em 2002, quando a rede mundial ainda era mato e nem todos tinham acesso (aqui no Brasil), pesquisas online nem sempre davam bons resultados. Seu conteúdo não era tão vasto quanto é hoje e também era pouco confiável. Este era o início da Era da Informação, em que ela começava a se tornar acessível.
Remakes e relações familiares
Em meu texto sobre Terror em Silent Hill (2006) eu mencionei que durante o início dos anos 2000 haviam muitos remakes de terror oriental sendo feitos nos EUA. O Chamado talvez seja o exemplo que melhor se traduziu para o ocidente. O original Ringu (1998), dirigido por Hideo Nakata, é uma adaptação de um livro homônimo, escrito por Kôji Suzuki em 1991 como a primeira parte de uma trilogia. No entanto, o cinema japonês emplacou outras cinco continuações, e acredite ou não, houveram vários remakes, incluindo uma versão para TV japonesa em 1995, uma mini-série japonesa em 12 episódios, uma versão sul coreana em 1999, e por último esta versão americana dirigida por Gore Verbinski.
Talvez o motivo pelo qual a história seja facilmente traduzida seja por causa da universalidade do tema: família despedaçada. O filme começa com a morte de Katie, despedaçando aquela família fisicamente e emocionalmente; Logo em seguida somos apresentados à protagonista, Rachel, e por mais que ela ame o seu filho, ela não é do tipo atenciosa, como vemos no diálogo dela com a professora. Também vemos que ela nunca cobrou este tipo de carinho dele, visto que ele a chama pelo nome e isso não a incomoda.
Não é fácil para ela ser mãe solo. Ela sacrifica o relacionamento com o filho pelo bem da sua carreira. Aidan não parece ser a sua prioridade, até o fatídico dia em que ele assiste a fita, e agora mais do que nunca Rachel precisará da ajuda do pai biológico.
Como Rachel diz à professora, Aidan é do tipo independente. Ele faz seu próprio lanche, vai à escola sozinho (na chuva), e até escolhe a roupa que sua mãe deverá usar no velório da Katie. O garoto é filho de Noah (Martin Henderson), apesar de nós já levantarmos essa suspeita pela relação conturbada entre ele e Rachel e por uma breve troca de olhares entre os dois. Noah não assumiu a paternidade porque, segundo ele, não teve um bom pai, e por esse motivo não quis repetir o círculo. Mas aparentemente uma tragédia tem o potencial de unir as pessoas.
Rachel e Noah reacendem a relação e, ao final do filme, Noah parece estar disposto a aceitar a responsabilidade de pai. Rachel também se transforma. No início a vemos como arrogante (como na cena com seu chefe, e com a professora), mas ao final ela não se preocupa em estar atrasada. Ela apenas quer ficar abraçada com seu filho, que agora parece se tornar sua prioridade.
Outra família despedaçada que temos no filme são os Morgan. Anna Morgan sempre foi obcecada por ter um filho, como se isso fosse um objetivo de vida ou um item de luxo que ela sempre quis ter. Tentou inúmeras vezes, mas sempre perdeu o bebê, até chegar com Samara, adotada – antes de ver a sequência de 2005, eu tinha minhas dúvidas se a menina era mesmo adotada – o que deveria trazer alegria ao casal, trouxe apenas angústias.
Anna passou a sofrer depressão, ter alucinações, os cavalos enlouqueceram e Samara passou a ser negligenciada pelos pais, que a aprisionaram no celeiro e eventualmente a mataram. Mas isso não não reestabeleceu a paz da família, uma vez que Anna cometeu suicídio em seguida. Em contraste com os pais negligentes que apresentamos, há a Dra. Grasnik, mãe de um garoto aparentemente com síndrome de Asperger, mas se esforça para cuidar bem dele.
Suspense em O Chamado
Um aspecto que torna o filme tão interessante é a forma como ele cria uma atmosfera de medo, suspense e repulsa. Primeiramente notamos que o filme se passa em períodos de chuva. Os leitores mais velhos devem se lembrar de quando o sinal da televisão não estava bom, ou não havia programação, o aparelho entrava em modo de estática (como na fita), mas todos chamavam aquilo de chuviscado.
De certa forma, é como se o mundo de Rachel estivesse nesse modo de “estática” ou “chuviscado” como na televisão. Elementos da fita aparecem em alguns momentos durante o filme, e imagens da fita também aparecem na tela, lembrando a nós e a protagonista das peças do quebra-cabeça. Além disso tudo, existem aqueles elementos que nos fazem sentir repulsa. Talvez o melhor exemplo disso seja o dedo sendo espetado no prego, e… Ops. Devo me corrigir. A cena mais repulsiva do filme é quando Rachel engasga e tira fios de cabelo da garganta. Ambas as cenas são trabalhadas para nos deixar incomodados.
Outro artifício que o diretor usa é a repetição de certos planos, como uma antecipação do que está por vir. Por exemplo: a pessoa em foco no primeiro plano e atrás dele surge uma silhueta fora de foco. As duas primeiras vezes em que isto acontece não oferece nenhum perigo, mas na terceira vez, subconscientemente estamos “relaxados”, não estamos totalmente preparados quando Richard Morgan (Brian Cox) agride Rachel. Outro enquadramento que é reproduzido mais de uma vez durante o filme é quando subjetivamente a câmera se aproxima de uma cadeira com alguém sentado. Por algum motivo esse plano sempre me lembra de Psicose (1960). A primeira vez que isso acontece é um alarme falso, já na segunda vez é algo sério. É satisfatório ver um filme de terror que se preocupa com estes aspectos ao invés de confiar em jump scares.
Referências e segredos escondidos
A referência ao clássico de Hitchcock é inegável. Gosto de acreditar que há outras referências ao mestre do suspense neste filme: quando Rachel pede para que Noah assista a fita, ela o deixa sozinho enquanto vai para a sacada de seu apartamento, lá ela olha para várias janelas, remetendo ao Janela Indiscreta (1954). Esta cena é emblemática, pois quando ela olha para a mulher no outro prédio, a mulher a olha de volta, como em reconhecimento.
O momento em que Rachel corre pelo convés do navio, querendo saber o que aconteceu com o cavalo que se jogara ao mar, me lembra uma cena de outro filme do Hitchcock, Marnie, Confissões De Uma Ladra (1964), em que o personagem vivido por Sean Connery corre pelo convés de um navio a procura de sua esposa e a encontra mergulhada na piscina.
Eis alguns outros toques interessantes: 1) Rachel mora no apartamento 601, se somarmos 6 + 0 + 1 = 7; 2) Quando Rachel vai ao Mountain Shelter Inn, o dono do estabelecimento insiste num jogo de adivinhar a carta que ela escolhera. Errando sempre, a última tentativa dele é um 7 de espadas; 3) A árvore de folhas vermelhas na pousada é um Bordo-Japonês, nativa do Japão, China e Coreia do Sul, e o fruto dela é conhecido como Samara. O nome Samara, apesar de ser comum, faz referência ao conto “Encontro em Samarra” de John O’Hara (1934), sobre um homem que encontra a Morte no mercado de Bagdá e foge para a cidade de Samarra. Quando questionada, a Morte diz que achou curioso encontra-lo em Bagdá, sendo que ela tinha um encontro com ele em Samarra. Este na verdade é um conto popular mesopotâmico.
Mas o que eu gosto mesmo são das imagens do círculo inseridas subliminarmente. Inicialmente na logo da Dreamworks, e novamente pela metade do filme (após a morte do cavalo na embarcação), que a imagem do círculo aparece em uma fração de segundo. Se você piscar, perdeu. Durante o filme formas circulares aparecem de forma sutil, como na blusa da Dra. Grasnik, a plaquinha com o número do apartamento de Rachel, e o ralo do chuveiro quando Rachel toma um banho purificador (seria esta outra referência a Hitchcock?); Outro toque inteligente é quando Rachel volta ao Mountain Shelter Inn pela segunda vez, abaixo da placa do estabelecimento, há uma outra que diz “Closed until further notice” (Fechado até segunda ordem), que nos dá uma pista do que acontecera ao dono do estabelecimento.
Campanha de marketing assustadora
O marketing de filmes de terror é um assunto que me interessa. Mas não aquelas campanhas que publicam “o filme mais assustador de todos os tempos” ou “baseado em fatos reais”, mas aquelas que geram um interesse, como foi a de A Bruxa de Blair (1999).
O Chamado teve uma campanha inteligente, que não se baseou nestas frases de impacto. Antes de ser anunciado, cópias da fita maldita foram colocadas sobre alguns assentos em cinemas selecionados nos EUA e Canadá, shows e outros eventos. A pessoa que a encontrasse com certeza ficaria curiosa para assisti-la quando chegasse em casa (talvez esperando conteúdo pornográfico), e iria se deparar com cenas bizarras, estranhas, sem compreender o contexto, que só faria sentido quando soubesse que essa fita está relacionada a um filme.
A esta altura a curiosidade já estaria a mil, pois na etiqueta da fita havia um endereço eletrônico (www.anopenletter.com) que não está mais no ar. Um site supostamente escrito por um pedófilo que havia assistido à fita e tentava alertar as pessoas sobre o que ele estava passando. Além disso, o site contava com links para outras farsas, incluindo uma página escrita por uma amiga da personagem Katie, que não sabia da morte da garota e acreditava que ele fora sequestrada ou fugira de casa. Outro link levava o leitor para uma página escrita por cientistas que pesquisavam fenômenos envolvendo transmissões televisivas (talvez algo relacionado à fala de Becca logo no início). Quando o filme foi lançado, a Dreamworks deletou essas páginas.
O terror dos rumores disseminados na internet
Eis aqui um dos pontos que gostaria de destacar que fazem de O Chamado um filme à frente do seu tempo. Presente numa fala do personagem Richard Morgan (Brian Cox), “Qual é o problema de vocês repórteres? Vocês pegam a tragédia de uma pessoa e forçam o mundo a vivenciá-la… espalham-na como doença.”. Em certo nível, seu posicionamento não está tão equivocado. O problema está em tratar a divulgação da notícia como uma doença.
Esta não é a primeira vez que o tema “doença” aparece no filme. Em dado momento, a Dra. Grasnik diz “Quando se mora numa ilha e pega um resfriado, se torna o resfriado de todo mundo.”. Uma metáfora meio obscura, que nem mesmo Rachel compreendeu. Particularmente eu vejo nesta fala um vislumbre de como a informação (ou até mesmo uma fofoca) se espalha de pessoa para pessoa, como uma doença. Da mesma forma se uma informação é bastante compartilhada na internet, ela se torna viral.
A situação em que Rachel se encontra, sua investigação acaba ganhando um status de lenda urbana, termo que foi substituído hoje em dia por creepy pasta – histórias divulgadas através da internet. O termo é uma junção da palavra “creepy”, que significa “arrepiante” ou “assustador”, com a expressão “copy paste”, que quer dizer “copiado e colado”. Assim como a fita em O Chamado, que é copiada e passada adiante – e por sua vez, se espalha de boca em boca, como uma doença – se engana quem acredita que tais “doenças” não podem afetar uma pessoa.
O Slenderman é um bom exemplo de como uma creepy pasta pode se espalhar como doença. A lenda urbana sugere a existência de um homem alto, pálido, de pernas compridas, com tentáculos, responsável pelo desaparecimento de crianças. Talvez este seja o primeiro grande mito que surgiu a partir da internet. Mais precisamente, a primeira imagem da entidade apareceu num concurso de photoshop do fórum Something Awful em 2009, postada por Eric Knudsen (cujo nick era Victor Surge) acompanhada de uma backstory.
A imagem repercutiu de forma que outros usuários da internet passaram a fazer suas próprias edições, sejam elas em fotos, áudios, vídeos, como os do canal Marble Hornet (que eu acompanhei), e até mesmo um game. Mas a brincadeira tomou proporções reais em 2014 quando duas meninas de 12 anos, Anissa Weier e Morgan Geyser, esfaquearam uma colega de escola, Peyton Leutner*, como se isso fosse um rito de passagem para se tornarem proxy (representante) da entidade. Mesmo sendo menores de idade, as duas foram condenadas pelo crime e cumprem pena até hoje.
A HBO produziu um documentário sobre o incidente, que nos mostra a reação dos pais, trechos do julgamento, e entrevistas com as duas meninas, que revela que elas não sabem avaliar uma mentira criada e difundida na internet. Enquanto Beware The Slenderman (2017) é altamente recomendado e nos mostra uma realidade chocante de um país doente, a Sony Pictures lançou o filme Slender Man: Pesadelo Sem Rosto (2018) e enfrenta processo pelo pai de Anissa por tentar lucrar com uma tragédia real – validando a frase de Richard Morgan.
O desafio da Baleia Azul
Outro fenômeno que resultou em mortes e teve seu início na internet foi o caso do desafio Baleia Azul, que consiste em uma série de tarefas indicadas por um líder. As tarefas têm o propósito de quebrar a alma da pessoa para que ela aceite sem contestar a data que cometerá suicídio. O desafio supostamente começou a partir da morte de uma moça russa em 2015, Rina Palenkova, de 17 anos, que postou uma selfie se despedindo das pessoas em sua rede social VKontake antes de se matar no trilho de um trem.
O periódico Novaya Gazeta publicou um artigo em 2016 sobre o alto índice de suicídios de jovens na Rússia, Cazaquistão e Quirguistão. Membros de fóruns sobre suicídio nesta rede social, e com imagens de Rina transformadas em meme, como um ídolo a ser seguido. As investigações seguiram em frente, e foram encontrados fóruns que incentivavam o suicídio. Em novembro de 2016 um jovem Philipp Budeikin foi preso por incitar o suicídio. Ele supostamente seria o criador desse desafio. Mais tarde Philipp confessou ter iniciado esse desafio (com outro nome, F57), e induzido 17 pessoas ao suicídio.
Como justificativa para si mesmo, Budeikin acreditava estar limpando a sociedade, separando as pessoas normais da escória. A história chegou a vários jornais do ocidente no ano seguinte, mas com um tom mais alarmista. No Brasil, a história acrescentou que mortes teriam acontecido no próprio país, Argentina e Espanha por causa desse desafio. Houve a divulgação de um texto supostamente enviado pela polícia para as escolas alertando sobre uma corrente de suicídio que estava sendo planejada. A carta pedia para que a mensagem fosse compartilhada. A partir de então o desafio Baleia Azul se tornou conhecido pelo grande público.
Segundo a notícia viralizada, para fazer parte deste desafio você deveria publicar em sua rede social uma hashtag específica e esperar que um “curador” o contatasse e passasse as tarefas. Você comprovaria a execução destas através de filmagens e uma vez entrado no grupo, você não poderia mais sair, pois sua família seria ameaçada. O desafio Baleia Azul ganhou grande repercussão na mesma época em que outros desafios igualmente perigosos, como o da canela em pó, do gelo e sal.
Por isso, é difícil dizer com precisão se este desafio realmente existiu, se existem casos no Brasil, se os suicídios na Rússia estão ligadas ao desafio. O fato é que o tema “suicídio” é um tabu, e a sociedade prefere culpar terceiros ao invés de olhar para dentro de si para ver o que está errado. Todo este cenário de um desafio que envolva suicídio e documentação dos dias que o antecedem são exploradas no curta-metragem Círculos (2005). A história segue os acontecimentos de O Chamado e dão início ao O Chamado 2 (2005), lembrando que o conteúdo do curta é muito anterior ao famigerado desafio.
Boneca Momo
A mais recente que tenho notícia é a Momo. Em janeiro de 2019 surgiram relatos de que a personagem surgia inesperadamente em vídeos da plataforma YouTube Kids, incitando crianças a se machucarem, ou se matarem. Como consequência disso, muitos pais proibiram seus filhos de acessarem a plataforma. O caso chegou até o Brasil e o Ministério Público da Bahia fez uma notificação ao Google e Whatsapp para impedirem a viralização deste grande mal.
Porém o YouTube não encontrou nenhuma evidência deste tipo de conteúdo, nem casos registrados de pessoas que tenham se ferido por orientação da Momo. Para quem já está familiarizado com a Internet (não é o meu caso), deve se lembrar de que a Momo se tornou viral nos EUA em 2018. As pessoas deveriam ligar para um determinado número (que não irei revelar) às 3:00 da manhã, em que a Momo respondia dizendo coisas perturbadoras.
Faço a advertência para que não assistam à fita liguem para este número, pois se trata de um golpe de um hacker para obter seus dados. O prefixo 81 é o código de área do Japão e o horário propício para a ligação é madrugada, tendo em vista não a hora macabra, mas sim a diferença de fuso horário. A entidade Momo já povoava a internet antes disso, como um meme. A figura é na verdade uma escultura criada pela Link Factory, uma empresa de efeitos especiais no Japão. Seu criador, Keisuke Aiso revelou que a destruiu, portanto Momo existe apenas em fotos.
Se um filme como este consegue gerar este tipo de discussão levantada neste texto, o veredicto é que ele passou com louvor do teste dos quinze anos, e é uma obra relevante. Recomendo ao leitor que chegou até aqui e ainda não o viu; e caso já tenha visto, indique-o para alguém que ainda não o tenha. Peça para esta pessoa recomendar para outros e assim poderemos fazer uma corrente de fãs desta obra cinematográfica.
* Os nomes das meninas, assim como imagens, foram divulgados no filme, pois respondem à jurisdição dos EUA. Se o crime tivesse acontecido no Brasil, os nomes e a imagem das autoras não seria divulgado em nenhuma mídia.
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