Hollywood tem uma quedinha por anti-heróis. Principalmente aqueles que ficam milionários e depois rendem boas histórias inspiradas em fatos reais. Nesse contexto, a protagonista de A Grande Jogada (Molly’s Game) é quase uma versão feminina de O Lobo de Wall Street (The Wolf of Wall Street), mas trocando a bolsa de valores por jogos de pôquer.
Molly Bloom (interpretada pela sempre ótima Jessica Chastain) foi uma garota que cresceu com a pressão de ser a melhor, tanto nos estudos quanto no esporte. Assim como a protagonista de Eu, Tonya (I, Tonya), que vivia sob o olhar duro e rigoroso da mãe, constantemente buscando um pouco de aprovação, Molly era uma esquiadora focada e dedicada, levada ao limite pelo pai (Kevin Costner). No entanto, competindo nas Olimpíadas, ela sofreu um acidente que colocou um fim prematuro à sua carreira como atleta.
Com uma mente brilhante e muita criatividade, Molly deu a volta por cima ao conhecer o empresário Dean Keith (Jeremy Strong) e organizar para ele uma mesa informal de jogos de pôquer. O diferencial? Só podiam jogar celebridades e milionários de Los Angeles, em uma espécie de clube fechado com encontros semanais. Não demorou muito para que Molly soubesse exatamente o que fazer para criar seu próprio império.
Embora tenha quebrado algumas leis aqui e ali, Molly conseguiu se manter na legalidade por um período suficiente para ganhar milhões. Charmosa e inteligente, ela era a personificação do que os norte-americanos mais adoram: a pessoa audaciosa que usa o sistema contra ele mesmo, para se dar bem. A ambição, no mundo capitalista, é o pecado mais perdoável de todos – afinal, quem é que não quer ser rico e fazer parte da elite da sociedade?
A verdade é que esse mundo criado por Molly, de luxo e glamour, mas também de vício, eventualmente entra em colapso. Ela se mete com drogas e, sem querer, com mafiosos russos, e é pega pelo FBI. Quando o filme começa, Molly está procurando a ajuda do relutante advogado Charlie Jaffey (Idris Elba), que acaba aceitando seu caso.
Boa parte do longa se passa no escritório de Jaffey ou em tribunais. As aventuras de Molly são narradas por ela no passado, como lembranças dos seus “tempos de glória”. Embora o filme seja sobre pôquer, qualquer desconhecimento sobre o jogo não chega a atrapalhar a compreensão do espectador. O diretor e roteirista Aaron Sorkin está mais preocupado com a dinâmica das relações entre os personagens do que com as cartas propriamente ditas.
Essa é a estreia na direção de Sorkin, que ficou conhecido pelos roteiros de A Rede Social (The Social Network), O Homem Que Mudou o Jogo (Moneyball) e Steve Jobs. Com muitos diálogos, geralmente rápidos e envolventes, o conceituado roteirista sempre foi atraído por personalidades obsessivas, anti-convencionais e geniais. Entretanto, como diretor, ele ainda peca na construção da atmosfera e na falta de inspiração estética e de fluidez narrativa ao transformar as palavras em imagens. Os flashbacks e o recurso da voz em off não ajudam, nesse sentido.
A Grande Jogada consegue entreter, por algum tempo, mas o filme se torna um pouco cansativo pela longa duração e pelo fato de que a protagonista parece uma pessoa que jogou fora seu potencial e optou por uma vida fácil, no crime. “Você teria sido bem sucedida em qualquer coisa que quisesse”, o pai dela chega a falar. Problemas familiares não resolvidos e um insaciável desejo de controlar homens poderosos fizeram dela uma mulher privilegiada, que desperdiçou ótimas oportunidades que a maioria das pessoas simplesmente não tem. A moral da história, se é que existe alguma, é que pelo menos ela não perdeu a chance de virar filme.