Diálogos são estruturas importantes para se construir um roteiro. Por meio deles é possível caracterizar personagens, passar informações ao público e dar substância à história. Entretanto, o texto no qual o filme se baseia também possui outros elementos estruturais como a capacidade visual, o encadeamento da trama e o arco narrativo das figuras dramáticas. Um bom roteiro consegue combinar todas essas questões e ainda abrir espaço para que o diretor manifeste sua visão criativa.
Frankie, o novo filme de Ira Sachs indicado à Palma de Ouro no Festival de Cannes, desconsidera algumas dessas regras e foca quase exclusivamente na conversa entre os personagens. A trama nos apresenta à Frankie (Isabelle Huppert), uma famosa atriz francesa que descobre ter apenas alguns meses de vida. Para construir memórias afetivas ela convida a família e alguns amigos a passar uma temporada na cidade portuguesa de Sintra.
O longa acompanha um dia na vida da artista. Mesmo assim é tempo suficiente para conhece-la. Frankie é a estrela de seu sistema solar. Ela gosta de ter a família rodando ao seu redor para que possa determinar o que acontece com cada um deles. Seja por isso, seja pelo câncer da matriarca, as relações entre os personagens são difíceis e um tanto estremecidas.
Ainda que o objetivo da viagem seja criar memórias felizes, Frankie não é muito bem-sucedida no projeto. O estágio terminal da doença faz com que ela não tenha tempo para sutilezas. Essa reunião é sua última oportunidade para dar as diretrizes finais de como cada um deve continuar vivendo após sua morte. Tal necessidade de controle transparece nos tons azuis que a circundam no figurino e no cenário. Seus maridos (o ex e o atual) expressam sua submissão diante dos desejos da atriz ao também utilizarem roupas azuis, porém em tons mais claros que o dela.
Todo filmado em longos planos, o título resume-se a pessoas conhecidas encontrando-se aleatoriamente e conversando em lugares bonitos. Repleto de diálogos, que muitas vezes não dizem nada, o filme se assemelha a uma série de TV onde a qualquer momento um personagem pode entrar pela porta e contar uma história. Tal recurso, aliado ao fato das pessoas caminharem sem rumo certo, transforma a narrativa em pequenas esquetes reunidas sem um propósito claro.
Com cenas faladas em inglês, francês e português, a produção possui certo caráter internacional. Essa salada cultural rende alguns momentos cômicos, bem aproveitados pela montagem. Curiosamente, na única cena em que todos os personagens se encontram não há diálogos. A essa altura, a narrativa já transmitiu todas as suas mensagens ao público, que então se admira com o belo cenário da locação e o impacto das palavras não ditas.
Apesar de raso, Frankie pode ser uma boa pedida para aqueles dias em que você quer descansar a mente e apenas assistir à Isabelle Huppert falar. Visto sem nenhum compromisso, o longa entretém e pode até mesmo agradar. Contudo, vá avisado: apesar de ser uma trama sobre relações humanas não existem grandes mudanças nos personagens. É apenas uma história onde pessoas caminham e conversam pela bela cidade de Sintra.
*Essa crítica faz parte da cobertura da 43ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo