Tudo passa pelo corpo. E é nesse território que dinâmicas de poder se rebatem no anseio de viver em plenitude.
Dividido em quatro atos (A Chegada de Alice, O Ímpeto , A Ação e A Contração), Pendular imerge na inconstância da criação artística como um meio de alcançar um ponto de contato consigo mesmo e na tentativa – quase sempre falível – , de chegar ao equilíbrio no encontro com o outro.
A diretora Julia Murat, que em seu primeiro longa, Histórias que só existem quando lembradas, já demonstrava seu interesse por manifestações artísticas para além do próprio cinema, traz no centro da trama o cotidiano de um jovem casal. Ele, escultor, ela, dançarina, vivendo num galpão, com ares de abandono e desprovido de qualquer traço de personalidade. Ali, lentamente são criados espaços de opressão. Seja pela presença do outro ou dos objetos que se acumulam gradualmente, sensação enfatizada pelo posicionamento de câmera, que se coloca enviesada, por trás dos materiais presentes no local, como quem espreita a ação que se desenrola.
A maior parte das cenas acontece dentro do galpão, até os momentos de relaxamento, prazer e diversão. Os ruídos externos da cidade não cessam jamais – trânsito, obras, buzinas, carros, pessoas. A vida lá fora segue seu fluxo. Os tons ocre adotados pela fotografia e a trilha que flerta com o suspense (exceto pela vivacidade da cena na festa, com a música “Aquela dança”, do Ronei Jorge e os Ladrões de Bicicleta, e a da intensa dança individual ao som de Joy Division), sugerem uma tensão constante, que não desaparece nem nas trocas mais íntimas.
No seio de tanta densidade, há ainda espaço para um personagem-alívio cômico. Um amigo do casal que trabalha como ilustrador protagoniza os raros momentos de descontração, colocando de forma leve uma discussão sobre o que seria arte erudita e arte popular (aqui é interessante notar que o artista plástico/escultor aparece em muitos momentos jogando videogame – símbolo da cultura de massa, tão criticada por ele).
Diante desse amálgama, se colocam muitos questionamentos: a arte estaria à frente, no primeiro plano, das vivências individuais e das relações? Até onde temos clareza pra definir o que pertence a nós e o que é fruto de nossas projeções?
Os limites, físicos e simbólicos, surgem cada vez mais borrados.
Seguir a linha, puxando o fio pra ver onde vai dar, buscando o desconhecido que tanto nos atrai e seduz, pode ser perigoso, porém, talvez seja a única maneira de encontrar a chave para acessar o outro. Será?