Numa longínqua montanha vive uma tribo isolada, regida com punho de ferro. O povo que ali habita precisa seguir várias leis impostas a eles e nunca contestadas. Aqueles que ousam desafiar esse código e sugerir a existência de seres fantásticos, por exemplo, são banidos do grupo. Mas essa linha dura tem explicação: a tribo está em risco de extinção e decidiu se refugiar para garantir a sobrevivência e manter distância dos predadores. Essa parece uma sinopse comum se o povo isolado não fossem os Yetis e os seres fantásticos/predadores, os humanos.

Assim começa PéPequeno, a nova animação dos estúdios Warner dirigida por Karey Kirkpatrick e Jason Resig. No filme acompanhamos Migo, um Yeti banido de sua sociedade por sugerir a existência do que eles chamam de PéPequeno (aka homens). Após romper as barreiras da montanha, Migo conhece o humano Percy e o leva até a tribo para ser readmitido e provar que estava certo o tempo todo.

Com um roteiro simples, o longa é uma aventura divertida de se acompanhar. O enredo mistura as tramas de educação e provação, focando ora nas mudanças profundas na visão do protagonista sobre a vida, ora em sua força de vontade ao lutar por aquilo que acredita. O texto também inclui elementos clássicos da cartilha de filmes infantis como a construção de novas amizades, a jornada com final positivo e a abordagem de temas profundos com pitadas de humor.

Por ser uma cria da Warner Animated Movies, os quesitos técnicos da produção merecem seu destaque. A animação em si enche os olhos e o design das criaturas é primoroso. A direção de câmera fez um bom trabalho nas cenas de perseguição na floresta, que contam com realistas efeitos de neve e um adequado contraste entre luz e sombras. Ainda vale ressaltar o uso eficiente das cores, que concede tons vermelhos aos momentos de perigo em contraposição à uma palheta clara usada nas sequências mais tranquilas.

Contudo, o maior mérito de PéPequeno fica mesmo por conta dos temas abordados. O longa consegue mostrar em tela assuntos importantes para adultos e crianças. Percy, por exemplo, está em busca da fama digital, anseio que hoje é comum a ambos os públicos. Já Migo possui uma jornada muito mais profunda de transformação. É ele que questiona valores estabelecidos, amplia a visão de mundo dos Yetis, tira a tribo do domínio do medo e mostra a importância de se adaptar ao novo.

O filme é eficaz também ao mostrar a visão dos líderes, que inventaram várias leis sem sentido com o intuito de proteger o povo. Essa compreensão marca um momento de amadurecimento de Migo, que entende não ser impossível fazer um omelete sem quebrar alguns ovos. No caso deles, a curiosidade e o pensamento contestador foram sacrificados em detrimento da segurança. Como arremate final, o título prega a importância de aprendermos a viver com as diferenças e tece uma leve crítica aos humanos, que tem como instinto destruir aquilo que não conhecem.

Com um bom ritmo e personagens cativantes, o filme se mostra um entretenimento leve e descompromissado. Mesmo que seja ideal para assistir com crianças, PéPequeno reforça as máximas que todos nós já conhecemos, mas que, em momentos tão conturbados como os que vivemos, valem a pena ser reforçados. Antes que a intolerância e a visão fechada de alguns nos façam fugir de vez para as montanhas, vale um último esforço de vida em comunidade.