Por Felipe Teixeira
Ninguém nunca imaginou que a empreitada do diretor neozelandês Peter Jackson em adaptar a trilogia O Senhor dos Anéis para as telonas daria tão certo. Uma aclamada obra, com personagens e lugares de fantasia nas mãos de um diretor pouco experiente e um orçamento considerável? Certamente algo sairia errado. Foi por isso que A Sociedade do Anel, primeira parte da trilogia, causou um alvoroço tão grande entre os espectadores e encantou crítica e público, que ficaram famintos pela continuação. Um ano depois, As Duas Torres veio para comprovar de vez a qualidade e grandiosidade da adaptação, expandindo a história e injetando espetaculares sequências de ação, mas sem nunca se esquecer de seus carismáticos personagens. Por fim, em 2003, a coroação de uma das melhores obras do cinema: 11 estatuetas do Oscar e mais de um bilhão de dólares para O Retorno do Rei, que encerrou a trilogia de forma incrivelmente satisfatória.
A saga de Frodo e Sam se aproxima do fim à medida que os dois hobbits e a criatura Sméagol chegam cada vez mais perto de Mordor, onde o Anel poderá ser destruído. Enquanto isso, Aragorn, Gandalf e o restante da Sociedade do Anel preparam-se para a grande guerra que decidirá o futuro da Terra-Média. A adaptação da terceira parte de O Senhor dos Anéis é mais uma vez competente graça ao cuidadoso trabalho dos roteiristas Frans Walsh, Philipa Boyens e Peter Jackson, que souberam alterar pontos necessários e cortar algumas passagens que não fizeram falta na história. Mas, com a dificílima missão de concluir inúmeros plots e amarrar todas as pontas soltas dos filmes anteriores, alguns trechos saem perdendo. A longa disputa entre Sam e Gollum pela confiança de Frodo é uma das partes menos interessantes da trilogia, por exemplo. O final do longa-metragem, que mostra o desfecho de vários importantes personagens e demora para se encerrar de vez também é frequentemente criticado, mas nada que ofusque o brilhantismo da equipe de roteiristas em adaptar tantas páginas, personagens e tramas para o cinema de forma tão coerente e equilibrada.
São tantos os momentos marcantes em O Retorno do Rei que poderia fazer um especial somente sobre eles. Com três horas de projeção, o longa-metragem é capaz de apresentar desde um dos momentos mais íntimos da trilogia, no diálogo sobre a vida após a morte entre Pippin e Gandalf, até a maior cena de guerra na história do cinema, sem qualquer receio de hipérbole. A chegada dos cavaleiros de Rohan em Minas Tirith e a sequência final na Montanha da Perdição são, em particular, dois momentos de catarse. E, ainda mais do que em A Sociedade do Anel e As Duas Torres, o filme traz alguns ótimos momentos de alívio cômico e puro entretenimento, principalmente com a dupla Gimli e Legolas (a cena do elfo em cima do Olifante é inesquecível), mais próximos e competitivos do que nunca. Tudo isto acompanhado pela fantástica trilha sonora de Howard Shore, que retoma os memoráveis temas da trilogia e conquistou o segundo Oscar em três filmes.
Elogiar a parte técnica do filme também já é quase redundante. A direção de arte, o som, o figurino e a já mencionada trilha sonora beiram a perfeição, e aqueles poucos que ainda reclamavam sobre os efeitos visuais utilizados em Gollum não puderam falar mais nada. Ainda mais realista e expressivo, o visual da criatura, interpretada com louvor por Andy Serkis, é impressionante neste último filme, e conseguiu ser ainda mais aperfeiçoado em O Hobbit – Uma Jornada Inesperada, nove anos depois.
Mas acima de todos os méritos da película está o trabalho de Peter Jackson, que entrega uma obra e um clímax tão épico e emocionante como o esperado. Sua habilidade em gravar grandiosas cenas de ação, intercalando travelings aéreos, que apresentam a dimensão da batalha, com lutas extremamente bem coreografadas, é extremamente eficiente. Analisando especificamente a cena da chegada de Théoden e seu exército à Gondor (que é tão boa que estou citando-a pela segunda vez), é imprescindível prestar atenção em cada plano e movimento de câmera utilizado pelo diretor. Com planos abertos que demonstram a magnitude da guerra e alguns close-ups em isolados soldados, Jackson é hábil em apresentar tanto o sacrifício e o desespero dos personagens ao mesmo tempo em que empolga e emociona o espectador para o grande confronto que se aproxima.
E por falar nos personagens, em O Retorno do Rei fica claro que os grandes heróis da história, dentre poderosos homens, elfos, magos e anões, são os pequenos hobbits do Condado. Perturbados pelo sofrimento causado por Sauron e tristes devido à distância de casa, Merry e Pippin, e principalmente Frodo e Sam, tornaram-se sérios e determinados, bem diferentes dos alegres e festeiros hobbits do primeiro longa. Por isso, é triste e tocante assistir a Frodo e seu fiel companheiro, imundos, exautos e nostálgicos, se arrastando no chão de Mordor rumo ao local onde podem concluir sua missão. E mais emocionante ainda é acompanhar o reconhecimento de seus sacrifícios pouco depois, quando os pequeninos são ovacionados em Minas Tirith, numa cena que leva muitos espectadores às lágrimas. O retorno ao Condado (que é bem tranquilo, ao contrário do livro) é reconfortante, belo e nostálgico, como diz o próprio Frodo Bolseiro: “Como se recupera sua vida antiga? Como é que se continua? Quando em seu coração, você começa a perceber que não há volta… há certas coisas que o tempo não pode consertar, alguns machucados que vão tão fundo que serão eternos.”
E assim chegou ao fim a Sociedade do Anel e a jornada de milhões de satisfeitos espectadores na Terra Média. Mais de dez anos depois, O Senhor dos Anéis – O Retorno do Rei é até hoje uma das maiores bilheterias da história e o único filme de fantasia a vencer o Oscar de Melhor Filme, além de ter o maior número de estatuetas, junto com Titanic e Ben-Hur. Títulos que não valem muito para alguns avaliadores, mas que expressam a importância e a qualidade da histórica saga para o cinema.