Por Magno Martins
Após dois anos da estreia de Luzes da Cidade, Charles Chaplin iniciou a produção de um dos maiores e mais icônicos filmes da história do cinema: Tempos Modernos (Modern Times), lançado em 1936. Chaplin iniciou a produção do novo filme só em 1933, já que os Estados Unidos passava por grandes transformações sociais e econômicas: a crise de 1929 atingiu gravemente os setores da indústria, comércio e serviços, deixando nada menos que 17 milhões de americanos desempregados, desencadeando uma crise social muito forte, guiada principalmente pela fome da população. Cada dia desse período era considerado um teste de sobrevivência, onde muitos se submetiam a empregos desumanos, outros entravam para o mundo do crime, outros morriam de fome pelas ruas da América.
Aparentemente, Chaplin observava toda aquela transformação histórica diante de seus olhos, especialmente em 1932 quando o então eleito presidente Franklin Delano Roosevelt, implementou o sistema New Deal, que tinha como prioridade acabar com o desemprego, além de determinar as quantidades de produtos, preços e salários. Com a redução da jornada de trabalho, os empregados eram obrigados a produzir muito mais.
Sendo assim, Chaplin buscou, mais uma vez, referências sociais para sua nova obras. Em 1933 ele iniciou o roteiro de Tempos Modernos, porém, ele foi mais audacioso: ao invés de deixar as mensagens subentendidas, seu novo filme abordaria todos os problemas sociais daquela época de forma explícita, levando em consideração os aspectos desumanos que a população americana enfrentava naquele delicado momento. Com isso, Chaplin se preparava para questionar diretamente pontos sociais considerados, por muitos, bem perigosos: capitalismo, fascismo, imperialismo e o nazismo. Chaplin chegou a ser advertido pelos seus amigos mais próximos sobre os possíveis problemas que ele teria com Tempos Modernos (já que sua nacionalidade era inglesa e o filme poderia render problemas diversos com a política americana), mas Chaplin estava determinado em escrever, dirigir e atuar em sua nova produção, dando vida novamente ao Vagabundo em suas divertidas confusões em torno das críticas sociais vividas por ele e pelos personagens do filme.
Tempos Modernos conta a história do Vagabundo nesse período da crise americana, inicialmente já trabalhando em uma indústria de produção de peças em série. Com suas chaves de fendas, ele divide as tarefas com seus demais companheiros, enroscando parafusos em uma grande esteira de placas metálicas. Claro que ele se atrapalha diversas vezes nesse árduo trabalho repetitivo, provocando diversas confusões com seus colegas de trabalho. Enquanto isso, o presidente da empresa recebe uma proposta de uma empresa sobre uma Máquina Revolucionária, que reduziria o horário de almoço de seus empregados, já que ela desempenharia todo o trabalho de alimentar os mesmos. Para testar a novidade, o presidente convoca o Vagabundo para testar a máquina. No início ela funciona muito bem, mas depois de alguns problemas técnicos, a engenhoca se mostra bem perigosa, fazendo com que o Vagabundo se alimentasse rápido demais e, somada às atividades repetitivas de seu trabalho, ele enlouquece de vez: começa a parafusar tudo e a todos ao seu redor, gerando grandes confusões até que ele vai parar em uma clínica psiquiátrica para tratar sua crise nervosa.
Depois de recuperado, o Vagabundo tenta voltar para seu emprego, porém, a indústria fechou as portas diante da crise financeira. Acidentalmente ele entra em uma manifestação comunista e acaba preso. Paralelamente a isso, o filme relata a história de uma pobre jovem (Paulette Goddard) que luta diariamente para sobreviver na crise americana, chegando a roubar alimentos para saciar a fome de suas irmãs mais novas e de seu pai desempregado. Sempre sorridente, seu olhar mostra uma esperança de uma vida melhor para sua família. Ao perder o pai, a jovem e suas irmãs têm seus destinos selados para um orfanato, porém ela foge das garras da polícia e do juizado de menores e passa viver nas ruas como mais uma indigente faminta, flagelada injustamente pela sociedade.
Quando seus caminhos cruzam, essa jovem e o Vagabundo criam um grande laço amoroso. Não como um casal, mas um amor de pai pra filha, de filha pra pai, um amor fraternal. Juntos eles deslumbram uma vida melhor, cheia de sonhos e fantasias. Mas, para ter essa vida com dignidade, eles colocam em mente que precisam trabalhar para realizarem seus sonhos. E é a partir daí que Tempos Modernos vai se moldando com diversas críticas diretas para o espectador, mostrando claramente como que as classes sociais se relacionavam, como eram os obstáculos e os caminhos para superação de todos aqueles problemas. Juntos, o Vagabundo e a jovem órfã revelam que, mesmo diante de tantos obstáculos da vida e até mesmo da relação entre eles, o sorriso e a humildade eram grandes aliados para sobreviver tudo aquilo. E certamente, Tempos Modernos pode ser bem adaptado nos dias atuais, já que vivemos em uma era tecnológica onde todos precisam se moldar a uma nova ordem para sobreviver.
Tempos Modernos trouxe para a carreira de Chaplin grandes marcos. Com um orçamento de US$1.500.000,00, Chaplin utilizou US$500.000,00 apenas na construção da máquina em que o Vagabundo caiu acidentalmente nos primeiros minutos do filme. A cena é tão marcante que o filme é relembrado hoje principalmente a partir desse impressionante take. Além dessa máquina, Chaplin construiu em seus estúdios os cenários das fábricas, o porto e o bairro operário. Foi a primeira vez que o público ouviu a voz do Vagabundo nos cinemas, onde o personagem canta improvisadamente no final do filme (Chaplin inseriu o som do seu personagem de uma forma crítica, de como a tecnologia do som interferia negativamente em sua carreira como diretor de Cinema Mudo). Tempos Modernos foi o último filme produzido para o Cinema Mudo na época (já que em 2011 o filme O Artista foi produzido quase totalmente dessa forma) e também foi o último filme em que o personagem Vagabundo foi exibido.
Mesmo sendo considerado um dos maiores clássicos do cinema, Tempos Modernos sofreu uma repercussão negativa nos EUA, já que as críticas levantadas por Chaplin foram consideradas fortes contra o sistema capitalista na época, resultando em vários boicotes de bilheterias e em premiações. Além disso, o filme foi proibido na Alemanha Nazista e na Itália, devido às fortes referências comunistas na história criada por Charlie Chaplin.
Porém, enganavam-se aqueles que pensaram que Chaplin desistiria de sua carreira depois de Tempos Modernos. Mal podiam esperar que outro mais polêmico ainda seria lançado muito em breve: O Grande Ditador.
A narrativa de Tempos Modernos é abordadas em detalhes no curso Introdução à Linguagem Cinematográfica ministrado pelo professor Donny Correia. Mais informações no link abaixo.
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