Na manhã de segunda-feira (27), aconteceu a coletiva de imprensa do filme Ferrugem, vencedor de melhor longa-metragem no Festival de Cinema de Gramado desse ano. Estavam presentes o diretor Aly Muritiba (A Gente e Para Minha Amada Morta), o produtor Antônio Junior e parte do elenco, Tifanny Dopke, Giovanni De Lorenzi, Clarissa Kiste e Nathalia Garcia.
O filme conta a história da adolescente Tati, que imersa no universo jovem tomado por celulares e redes sociais, acaba tendo algo que não queria se tornar público divulgado, gerando consequências para ela e a todos ao seu redor.
Logo no início, Tifanny Dopke foi perguntada sobre sua relação com a personagem e o que fez ela refletir: “vários aspectos da minha vida como atriz e pessoa mudaram, você se posiciona diferente em vários momentos, notando facilmente mais situações que não são positivas, como brincadeiras na adolescência”. Disse ter tido uma percepção muito melhor do universo em que está inserida, sendo que na época das filmagens tinha 16 anos.
Ao ser questionado sobre o tipo de narrativa que quis adotar no filme, Muritiba respondeu que sua obra “não é sobre quem fez, mas por que fez e o que se vai fazer a partir disso”, sendo que na segunda parte do filme queria tratar “como um gatilho de provocação de interesse, sobre culpa e tomada de consciência”.
Ao comentar a repercussão que o filme teve em festivais internacionais, como o Sundance Film Festival, o cineasta falou que a obra ultrapassava identidades e fronteiras, tendo fascinado bastante os jovens e adultos. contou do feedback de uma senhora que declarou ter “adorado o filme por estar falando sobre coisas que preocupam muito nos EUA, temas que discutem muito por lá. Ainda bem que não é um filme americano, porque ele seria completamente diferente, com um ‘happy end’”.
Sobre a obra ser direcionada para um público jovem ou adulto, Muritiba brincou falando que se tratava de um “filme para toda a família”, já que “proporciona uma conversa intergeracional” sobre temas que afligem os jovens, como vazio existencial, falta de preparação para a vida adulta, ter a ilusão do mundo ser a terra da felicidade e com isso não saber ligar com a frustração.
Indagado sobre os pôsteres de divulgação do filme (que trazem os personagens segurando os celulares em forma de arma) e o título do filme, argumentou que “o celular é utilizado como arma, apontada para o outro, como é o tribunal da internet, mas para si mesmo também, porque você está sujeito que o julgamento volte para si. Além de prazeroso, pode ser muito perigoso e tóxico.”
Sobre o título, afirmou: “O título funciona como metáfora para o que acontece internamente com os personagens, é a oxidação que causa no ferro e, enfim, ocasiona sua destruição”, em referência a corrosão emocional dos personagens.
Por trazerem camisetas com os dizeres “e agora que você sabe?”, o cineasta respondeu que se tratavam das camisetas da marca PEITA, relacionada a causas feministas e falou: “nós achamos que apenas lançar o filme era muito pouco, porque são questões que precedem o filme e sentimos ser responsáveis por divulgar várias questões, como machismo, misoginia, revenge porn, cyberbullying, procuramos parceiros para escutar e entender”.
Ele citou também o site do filme, que traz uma campanha completa com intuito de conscientizar os jovens e os adultos de quais atitudes tomarem caso algo do tipo aconteça e trazendo diversas informações que servem para inteirar dos perigos que esses tipos de ações, como vazamento de conteúdo e cyberbullying, podem acarretar.
Clarissa Kiste, que na trama encarna a personagem Raquel, falou que se tratava de uma personagem que também era julgada. “O espectador a julga, porque o filho e o pai não falam com ela, pensam ser uma mãe relapsa, mas ela está lá presente, reconhece como aqueles homens se protegem e mesmo sendo duro, ela assume as consequências”. “É um presente como mulher poder representá-la”, concluiu.
Sobre a inspiração e o interesse em realizar Ferrugem, Muritiba disse que a ideia veio do questionamento de qual seria o momento certo de dar um celular para seu filho, como ele se comportaria e seria responsável numa realidade interconectada e qual é a experiência de ser um jovem naquele mundo.
O cineasta disse que esse se trata de um segundo filme de uma trilogia que concebeu, sendo o primeiro filme Para Minha Amada Morta. “Me interessa muito o poder da imagem e do registro como não apenas preservar memórias, mas também de desencadear histórias. É a imagem como construtora de identidade e como desconstrução e esfarelamento de crenças, é como um avatar de si mesmo”.
“Quando você se filma ou você expressa uma intimidade ou algo que quer os outros vejam como você é. Quando um vídeo íntimo vaza, ele causa dores pessoais, como no caso de Para Minha Amada Morta. Assim como a desconstrução da imagem da mulher em Ferrugem. O terceiro filme, Deserto Particular, será filmado a partir do ano que vem”.
Ferrugem estreia comercialmente nos cinemas nessa quinta-feira, dia 30.