O Silêncio (1963) é o terceiro e último filme da homônima trilogia de Ingmar Bergman. Os longas anteriores foram Em Busca da Verdade (1961) e Luz de Inverno (1963). O que normalmente esperamos de uma sequência cinematográfica é um fio condutor, ora temático, ora narrativo, que teça uma teia entre as diversas obras em questão. Este deve aproximar as diferentes películas, dando continuidade e, ao mesmo tempo, adensando o discurso do diretor.

Do mesmo modo que os outros dois filmes da trilogia, bem como de sua carreira em geral, o diretor retoma à problemática da condição humana, em um viés opressivo, onde a impossibilidade de um encontro com a alteridade parece ser o ponto central da narrativa.

Sabemos que a realidade e a linguagem são dois tópicos que nunca se encontram. E parece que é exatamente dessa problemática, levada a uma exacerbação radical, que discorre O Silêncio (1963). Uma errância absoluta do ser na linguagem que impede um contato efetivo entre as personagens: Ester (Ingrid Thulin), Anna (Gunnel Lindblom) e Johan (Jorgen Lindstrom). Estamos na encruzilhada da comunicação.

Daí o nome do filme ser tão emblemático. Não pela mudez das personagens, pois todas são dotadas da capacidade da fala. Mas pela falta do sentido, perdido num abismo, onde a comunicação de uma personagem parece nunca chegar com plenitude à consciência da outra.

Ester é uma mulher de meia-idade, tradutora de livros e portadora de uma doença terminal. Anna é sua irmã mais jovem, uma mulher cheia de vitalidade. Johan é o filho de Anna.

A trama começa em um trem. Ester, a irmã mais velha, parece definhar na cabine do vagão. A doença da personagem impossibilita a continuidade do trajeto, fazendo com que a família repouse em uma cidade que está em meio a um conflito armado. Ali, em um luxuoso hotel, a narrativa se desenvolve, retratando a inveja, o ódio, a dependência, a ausência de afeto em geral que permeia o relacionamento da família.

Mesmo convivendo lado a lado, no mesmo quarto de hotel, os protagonistas nunca se encontram efetivamente. O ressentimento doentio de um pelo outro é enigmático.

Ester tem inveja da irmã mais jovem, de sua vitalidade e saúde. Anna inventa narrativas com a intenção de humilhar sua irmã mais velha. Johan, abandonado por Anna, vagueia pelo hotel, bisbilhotando sua mãe, ao mesmo tempo em que se diverte com os outros hóspedes.

O clima de tensão em que vive o país parece ser o mesmo clima de tensão em que vivem as personagens. As irmãs estão literalmente em guerra.

Há um breve momento em que Ester se aproxima de Anna, em um gesto quase incestuoso, suplicando para que a irmã não a deixe. Em outra cena, há uma tentativa de demonstrar afeto, mas logo uma fúria toma o corpo das protagonistas. Não há escapatória. Há um abismo declarado que sistematicamente afasta as personagens.

A direção do filme é brilhante, com planos ousados, como quando Bergman filma os ataques que sofre Ester devido a sua doença. Ao lado de uma direção excepcional, estão as atrizes com uma atuação vigorosa.

O Silêncio é um filme sobre o homem, não com H maiúsculo. Retrata a nossa mediocridade, a nossa condição baixa de um modo indiscutível. Fala do homem de carne e osso, dotado de contradição. Enfim, é um filme sobre a condição humana, com suas relações problemáticas e ambíguas que afetam e dizem respeito a qualquer um de nós.

O tratamento de som e a interação entre os personagens de O Silêncio são abordados no curso Introdução à Linguagem Cinematográfica, ministrado pelo professor Donny Correia. Mais informações no link abaixo

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