Às vezes, é preciso dizer o óbvio. Essa talvez seja a “mensagem” de Não Olhe Para Cima. O longa, dirigido e roteirizado por Adam McKay (de Vice e A Grande Aposta), é uma sátira que mostra a reação de governos, mídia, comunidade científica e cidadãos comuns diante da ameaça da destruição de toda a vida no planeta Terra por um gigantesco cometa.
Lançado em dezembro de 2021, o filme já se tornou o mais assistido da história da Netflix, com mais de 152 milhões de horas visualizadas. Muito disso se deve à polêmica em torno das críticas políticas nada sutis que aparecem na história. Outro grande atrativo é o elenco de peso, que inclui 5 vencedores de Oscars (Leonardo DiCaprio, Jennifer Lawrence, Cate Blanchett, Meryl Streep e Mark Rylance) e 2 indicados ao Oscar (Timothée Chalamet e Jonah Hill).
Embora a história pareça muito atual, por conta da pandemia e dos desgovernos que levaram o mundo a um cenário quase apocalíptico, Não Olhe Para Cima começou a ser produzido em 2019. Adam McKay afirmou que o roteiro se baseou no negacionismo em torno da crise climática.
Mas são justamente ao roteiro algumas das maiores críticas a Não Olhe Para Cima, embora o longa tenha sido indicado a 4 Oscars, este ano (melhor filme, edição, música original e, ironicamente, roteiro original). Há quem diga que o diretor tentou se levar a sério demais, subestimou sua audiência e deixou totalmente a sutileza de lado para falar o que todos já sabem: que o negacionismo pode nos matar. O problema é que esse tipo de abordagem não ajuda a mudar a opinião de quem mais precisaria se conscientizar, que são os próprios negacionistas.
Por outro lado, se a frustração dos cientistas Kate Dibiasky (Jennifer Lawrence) e Dr. Randall Mindy (Leonardo DiCaprio) diz algo sobre a nossa sociedade é que estamos cansados de bater a cabeça contra a parede, em uma luta constante e muitas vezes sem sucesso contra a ignorância. A graça do filme vem do fato de que a maior parte das coisas que ele retrata poderiam ser verdade, mas seria realmente engraçado se não fosse trágico.
Não há dúvida de que todo o elenco é maravilhoso, mas às vezes alguns personagens escorregam em caricaturas (como Meryl Streep fazendo uma versão feminina de Donald Trump). O maior erro de Não Olhe Para Cima talvez tenha sido retratar os “vilões” como se fossem estúpidos, preferindo ignorar a ameaça iminente de extinção da humanidade. Possivelmente eles tenham agido assim, no filme, porque os poderosos sempre parecem ter um Plano B. Aliás, a nave da BASH, que parte em busca de um novo planeta para os seres humanos, é muito parecida com o design do foguete New Shepard (aquele com formato fálico), lançado pelo bilionário Jeff Bezos ao espaço, no ano passado. É uma paródia intencional à corrida espacial dos super ricos, querendo fugir de um lugar que ajudaram a destruir.
“Talvez a destruição do planeta não deveria ser divertida”, explode Kate, em determinado momento, quando percebe que tudo se tornou uma grande espetacularização. O mesmo pode ser dito de Não Olhe Para Cima, que não é capaz de divertir (por ser tão parecido com o drama que vivemos), mas provavelmente também não será capaz de alertar quem está convencido a não “olhar para cima”. Infelizmente, nesse caso, a ficção não consegue sequer ser mais ridícula ou revoltante do que a realidade.
Não Olhe Para Cima
Ano: 2021
Direção: Adam McKay
Roteiro: Adam McKay, David Sirota
Elenco principal: Leonardo DiCaprio, Jennifer Lawrence, Meryl Streep, Jonah Hill, Rob Morgan, Cate Blanchett, Tyler Perry, Mark Rylance, Timothée Chalamet
Gênero: Comédia, drama, ficção científica
Nacionalidade: Estados Unidos