Nesta segunda-feira, 13, aconteceu a coletiva de imprensa do filme A Filosofia na Alcova, obra realizada pelo grupo de teatro Satyros e dirigido por Ivam Cabral e Rodolfo Garcia Vásquez. Estavam presentes ambos os diretores, os atores Henrique Mello, Bel Friósi, Felipe Moretti e o maestro Marcelo Amalfi.
O filme é baseado no romance de 1795 escrito por Marquês de Sade, encenada como peça de teatro desde os anos 1990 pelos diretores e pela companhia Satyros. A história é centrada em Eugénie, uma jovem virgem que passa a ter uma educação sexual intensa onde os ensinamentos flertam com o erotismo e questões políticas.
Ivam Cabral falou da peça feita nos anos 90, que ele diz ter sido resposta a um Brasil que ele temia. “Na época a gente contextualizou politicamente, a gente vivia um país saindo da ditadura, procurando seus caminhos e tudo era nebuloso, e nesse período não havia nenhum Ministério da Cultura e nenhum incentivo a cultura. Ali havia nenhuma possibilidade de um futuro saudável” e conclui, “27 anos depois e a gente tem o mesmo Brasil e a mesma falta de futuro e esperança”.
Uma das questões mais abordadas na coletiva se tratava da repercussão do filme pós-lançamento, por conter cenas de sexo explícitas que incomodariam grupos e partidos políticos conservadores hoje ativos em censurar exposições e artistas. Vásquez disse ter conversado bastante com a equipe sobre isso e que a situação do país se radicalizou muito. “O artista está o tempo inteiro trazendo as questões da sociedade e o momento atual é bastante emblemático, porque o ódio ao diferente e a intolerância está muito presente, existe um motor de destruição em volta das relações sociais que está pesando muito. Trazer essas questões no cinema é uma forma de jogar na cara de nós, brasileiros, como tudo pode ficar tão pesado e difícil, mais do que já está. O artista tem que discutir isso”, falou.
Sobre a trilha sonora, o maestro Marcelo Amalfi disse ter uma relação frutífera com Ivam e que ele criou vários sons e vozes ouvidos nas composições do filme, “A direção está sempre muito próxima”. Também falou do processo de criação, onde, assim como no teatro, ele projetava as imagens do filme na parede de casa, pegava seus equipamentos e começava a tocar. “[a trilha] não está no lugar que normalmente ela está, mas também não está fora de seu lugar”, disse.
Ao falar da produção e locações, os diretores disseram que o filme custou cerca de 200 mil reais, financiados totalmente pelo Satyros. A decisão foi tomada porque segundo Ivam, eles nunca fizeram “nenhum projeto de incentivo ou lei porque ele nunca seria financiado por qualquer pessoa e não fomos atrás de absolutamente nada”. Também falaram que boa parte do filme foi realizada no galpão de uma empresa em Santo André, enquanto a cena da orgia (“A maior cena de orgia da história do Cinema Brasileiro, segundo a Folha de SP”, disse Ivam) foi gravada no Espaço Satyros. Já as cenas que continham o pai de Eugénie foram filmadas num quarto de motel em São Paulo com temática romana.
Ivam também desabafou que sua real insatisfação não se dá se pessoas protestarem na porta do cinema, mas por ter sido negado em todos os festivais em que foi inscrito e os ataques pessoais que sua equipe pode sofrer. “A gente chegou na Mostra por exemplo, no primeiro filme concorremos a um prêmio, tínhamos absoluta certeza que o filme estaria dentro e misteriosamente ele não foi selecionando e em nenhum outro festival, a não ser o Festival Mix Brasil, que é um festival que abre para essas experiências”. Sobre ataques pessoais que a equipe do filme poderia sofrer disse: “Preocupo-me com a devassa em nossas vidas, são movimentos muito conservadores como MBL, eles jogam muito baixo e eu temo, sim, porque são vidas que se entregaram para o filme e que tem uma história no Satyros”. Completou, ainda, que não há nenhum tipo de estratégia para caso aconteça a repressão desse tipo de grupo, mas certificou de que o filme tem faixa etária de 18 anos e que não foi feito com dinheiro público. “Não foi usado dinheiro deles”, concluiu Rodolfo.
Quanto aos atores, Felipe Moretti disse que houve ensaios intensos para a preparação do filme. “Houve um trabalho com a pronúncia do texto, já que teatro é muito mais expansivo. Tivemos um baita apoio, ficamos quase dois meses repassando todos os textos, ensaiando, fizemos alguns trabalhos de câmera, nos acolheram muito bem”, informou.
Já Henrique Mello falou que o trabalho foi bastante facilitado por estar trabalhando com companheiros de longa data. “Trabalho no Satyros há 15 anos, tenho total confiança neles, são minha família. Não abandonamos o teatro totalmente, a linguagem, a maquiagem ou os diálogos são muito teatrais. Foi um prazer fazer, literalmente”, brincou.
Sobre a questão do teatro no cinema, Bel Friósi disse se tratar da parte mais legal do filme: “é o teatro dentro do cinema e o cinema dentro do teatro, eu enxergo como uma linguagem nova de qualquer outra coisa. É algo totalmente novo no Brasil ou do que eu conheço e facilitou para nós porque tínhamos liberdade para criar e nos adaptar para o cinema”.
A dupla de diretores revelou que sempre houve um projeto para fazer cinema, que, desde 1989, no início do Satyros, sabiam que iriam para esse formato.
A Filosofia na Alcova tem sua primeira exibição para o público geral no Festival Mix Brasil, no dia 17 de novembro, sexta-feira. O filme lançará comercialmente no Brasil no dia 23 de novembro.