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Talvez essa seja a melhor palavra para descrever a comunidade LGBTQIA+ retratada em Paris is Burning (1990), filme-documentário estadunidense, dirigido e escrito por Jennie Livingston durante a década de 1980. Obviamente, não me refiro ao sentido conservador atribuído à palavra. Ao invés disso, focalizo aqui sua radicalidade política transformadora. O uso da palavra e sua definição – que ou quem está fora do uso geral, habitual ou comum; estranho, excêntrico – como arma política de indivíduos que escapam das normas abestadas da sociedade que, mesmo capengas, insistem em persistir.

Aqui está a atualidade de Paris Is Burning (1990): um retrato da cena do salão de baile da cidade de Nova York, mais conhecida como Ballrooms. Nesse aspecto, o filme de Livingston, mesmo envolto em polêmicas sobre apropriação e privilégio, toca em questões urgentes relacionadas à comunidade LGBTQIA+ que continuam a atravessar nossa contemporaneidade.

Com um forte recorte em questões de raça e transgeneridade, o filme foca os anos de glória dos Ballrooms, dando ênfase em seu aspecto revolucionário, político e subversivo. As cenas são intercaladas entre depoimentos com figuras de destaque dos bailes e takes voyeristas, onde a câmera acompanha os frequentadores dos Ballrooms nas ruas de NY e nos próprios salões.

Ao longo da narrativa percebemos a importância dos bailes para a comunidade LGBTQIA+ e os principais aspectos que envolvem a cena como o vogue, o vestuário, os juris, as categorias, as casas, etc. Tudo isso embalado por depoimentos perturbadores e, ao mesmo tempo, inspiradores. Quem nunca viu Paris is Burning (1990), provavelmente conhece a aclamada série da Netflix, Pose (2018).  A série, que parece se alimentar diretamente de Paris is Burning (1990), também é um retrato dos Ballrooms e vem ganhando cada vez mais notoriedade.

Talvez a beleza de Paris is Burning (1990) esteja na capacidade de retratar a pungência criativa de indivíduos que, mesmo sufocados pela opressão, conseguem extrair desta um sulco de arte e esperança. Nesse sentido, o filme adquiri notoriedade na medida em que registra um ambiente cultural efervescente produzido por indivíduos que não são incorporados pelas camadas normativas da sociedade. Estes são extravagantes em seu modo de falar, pululam pelos esgotos e vielas das noitadas, dançam, competem, amam, transam, sonham, enfim, vivem com a ambição e o desejo de existir como são.

*Fundada em 1982, a House of Xtravaganza é uma das casas mais famosas da cena do salão de bailes da cidade de Nova York.

Paris is Burning

 

Ano: 1990
Direção: Jennie Livingston
Roteiro: Jennie Livingston
Elenco principal: Pepper LaBeija, Dorian Corey, Angie Xtravaganza, Willi Ninja, Octavia St. Laurent
Gênero: ​Documentário
Nacionalidade: Estados Unidos

Avaliação Geral: 4