Por Sttela Vasco

Apesar de o espaço das mulheres no cinema estar em constante – e lento – processo de ampliação, ainda é difícil para elas obterem os mesmos reconhecimentos e oportunidades que os homens na indústria cinematográfica, seja no cenário independente ou nos grandes polos comerciais. Em seu discurso de aceitação do Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante em 2015, Patricia Arquette cobrou salários igualitários nos Estados Unidos, recebendo o apoio de nomes como Meryl Streep, que a aplaudia fervorosamente da plateia. A mesma Meryl que recentemente financiou um programa anual para o desenvolvimento de roteiros escritos por mulheres com mais de 40 anos.

Anna Muylaerte, diretora do aclamado Que Horas Ela Volta?, questionou muito a participação das mulheres no cinema enquanto realizava a divulgação do filme. Em uma entrevista, ela contou que quando foi negociar a distribuição do longa em Berlim foi negligenciada por um dos agentes. “O distribuidor disse que gostou do filme, que achou incrível, que os personagens são incríveis. E ele só olhava para o coprodutor. Em nenhum momento olhou para mim. Foi como sugerir que, se o filme é bom, o responsável por ele é um homem, e não uma mulher”.

As vozes femininas que cobram por mais oportunidades e igualdade dentro do meio cinematográfico estão cada vez mais expressivas e ativas, porém, o caminho ainda é bastante longo. Em pleno Dia Internacional da Mulher, decidimos dedicar nosso #5+1 àquelas que já realizaram grandes obras para o cinema e ocupam com maestria um cargo que ainda é majoritariamente masculino na indústria: a direção. Para a nossa lista buscamos apostar na diversidade e colocar em evidência diretoras das mais diferentes culturas e etnias. Porém, um espaço para seis nomes é muito pequeno para tanto talento. Faremos nossas menções honrosas ao final, mas, caso você sinta falta de alguma, não deixe de citar nos comentários!

Sofia Coppola

Sofia Coppola

Difícil falar sobre mulheres diretoras e não pensar imediatamente em Sofia Coppola. Filha do aclamado cineasta Francis Ford Coppola, Sofia conseguiu grande notoriedade em meio à indústria. Sim, ter um pai famoso sempre é de grande ajuda, mas apenas isso não basta para consolidar uma carreira. Com grande talento, ela é conhecida por imprimir delicadeza e sutileza em seus longas com personagens femininas marcantes, além de muita cor – vide um de seus maiores sucessos, Maria Antonieta (Marie Antoinette) com Kirsten Dunst. Vencedora do Oscar de Melhor Roteiro Original em 2004 por Encontros e Desencontros (Lost in Trasnlation), Coppola é um dos nomes femininos mais fortes da direção atual e deve se manter firme no cinema hollywoodiano. Em dezembro, ela dirigiu a comédia musical especial de Natal da Netflix A Very Murray Christmas, com Bill Murray no elenco.

Haifaa Al-Mansour

Haifaa Al-Mansour

Haifaa não é nada menos do que a primeira diretora da Arábia Saudita e a responsável por fazer o primeiro longa totalmente rodado no país. Conhecida por O Sonho de Wadjda, de 2012, Mansour desafiou os próprios costumes ao se colocar por trás das câmeras e contar a história de uma garota saudita que não se adapta bem à própria cultura e cujo maior sonho é ter uma bicicleta, o que é proibido para meninas. Por sua “ousadia”, Haifaa recebeu ameaças, precisou de diversas autorizações – que eram frequentemente checadas pela polícia – e chegou a precisar dirigir os atores de dentro de uma van e pelo celular nas locações em regiões mais conservadoras. Os obstáculos, porém, não a impediram de entregar uma obra belíssima e comovente. Curiosamente, em abril de 2013, algum tempo após o lançamento do filme, o governo saudita passou a permitir que garotas andem de bicicleta em áreas de lazer junto a um responsável. Mansour, por sua vez, se mantém firme na carreira e prepara para este ano seu próximo filme A Storm in the Stars, estrelado por Elle Fanning.

Ava DuVernay

Ava DuVernay

A californiana Ava DuVernay ganhou bastante notoriedade em 2015 após lançar Selma, uma cinebiografia sobre Martin Luther King Jr.  com enfoque nas marchas realizadas por ele e ativistas pacifistas em 1965 entre a cidade de Selma, no Alabama, até Montgomery, a capital do estado. Apesar de o longa ter sido indicado a Melhor Filme no Oscar 2015 e de Ava ter sido nomeada ao Globo de Ouro no mesmo ano, DuVernay foi esnobada na categoria de Melhor Direção, o que gerou indignação em boa parte dos cinéfilos. Ela também foi responsável por episódios da aclamada série de Shond Rhymes, Scandal e poderá ser vista em Life Itself – A Vida de Roger Ebert, um documentário sobre a vida de um dos maiores críticos do cinema mundial.

Céline Sciamma

Céline Sciamma

A francesa Céline Sciamma estreou na direção já com uma obra bastante reconhecida: Lírios D’água, sobre a história de três garotas de 15 anos que praticam nado sincronizado e estão começando a se descobrir, tanto sexualmente quanto como pessoas. De lá pra cá, Sciamma apenas cresceu e se manteve entregando ótimos trabalhos. Seu longa seguinte, Tomboy, conta a história de Laure, uma garota que gosta de se vestir com roupas masculinas e, após uma colega confundi-la com um menino, passa a adotar a identidade de Mickäel. O filme reforça a sensibilidade e habilidade de Céline de transmitir as dúvidas e questionamentos da adolescência – em especial das meninas – sem floreios ou  exageros. Suas personagens são verdadeiras e humanas, sem apelar para um drama exacerbado ou estereótipos, apenas expondo a vida em si. Seu trabalho mais recente, Garotas, sobre uma jovem que se une a uma gangue, mostra que a diretora vem para ficar e que se pode esperar boas obras dela.

Laís Bondanzky

Laís Bodanzky

A diretora brasileira da nossa lista é responsável por um dos filmes mais impactantes do cinema nacional, Bicho de Sete Cabeças. Em uma época em que o debate sobre as drogas era bem menos aberto e mais problemático do que hoje – o longa é de 2001 – Laís trouxe questionamentos fundamentais e perturbadores. A relação entre pais e filhos e o tratamento dado a pacientes em hospitais psiquiátricos está presente o tempo todo, incomodando e fazendo pensar. A história não atenua ou romantiza a situação, exigindo uma direção cuidadosa e firme, o que Bodanzky faz muito bem. O filme gerou vários debates na época de seu lançamento e foi muito bem recebido pela crítica, dando destaque a Laís. Se mantendo na esfera dos relacionamentos e questionamentos humanos, a diretora ainda fez, por exemplo, As Melhores Coisas do Mundo e Chega de Saudade, filmes menos “duros” do que Bicho, mas com o mesmo cuidado e firmeza na direção. Seu próximo trabalho, Como Nossos Pais, ainda sem data para estrear, trará Maria Ribeiro como protagonista e contará a história de uma mulher que passa a se ver na posição de mãe dos pais e filha dos filhos.

E a diretora além dos clichês…

Kathryn Bigelow

Kathryn Bigelow

Nascida na Califórnia, Kathryn Bigelow foi a primeira mulher a ganhar um Oscar na categoria Melhor Direção em 2010 com o longa Guerra ao Terror, vencendo nomes como Quentin Tarantino (que havia sido indicado por Bastardos Inglórios) e James Cameron (indicado por Avatar) além de receber o prêmio de Melhor Filme. Conhecida por dirigir filmes fortes, com uma guerra como pano de fundo e, principalmente, conectados de alguma forma à relação dos EUA com o terrorismo, Bigelow também foi responsável por A Hora Mais Escura, que chegou a ser indicado ao Oscar de Melhor Filme em 2013. Kathryn, assim como as diretoras aqui citadas, vão contra a noção estereotipada que filmes feitos por mulheres precisam ser ”fáceis” ou leves. Cada uma enquadra suas lutas e suas crenças de sua maneira e contam suas histórias como acreditam. Ela ainda foi a responsável pelo primeiro Caçadores de Emoção, de 1991, que ganhou um remake esse ano. Seu próximo trabalho, previsto para 2017, segue sem título e contará a história de uma batida policial ocorrida na cidade de Detroit em 1967 e gerou uma das maiores revoltas populares da história dos Estados Unidos.

Como expliquei acima, seis nomes em meio tantas figuras talentosas é pouco. Por isso, deixo aqui as minhas menções honrosas (em ordem alfabética) a diretoras que realizaram grandes trabalhos e contribuíram para o fortalecimento das mulheres dentro da indústria. Caso você sinta falta de alguma, conte para nós nos comentários!

Anna Muylaerte (Que Horas Ela Volta?); Claire Denis (Bastardos); Debra Granik (Inverno da Alma); Jane Campion (O Piano); Kimberly Peirce (Meninos Não Choram); Lisa Cholodenko (Minhas Mães, Meu Pai); Lone Scherfig (Um Dia); Lucrecia Martel (A Menina Santa); Lynne Ramsay (Precisamos Falar Sobre o Kevin); Mary Harron (Psicopata Americano), Mélanie Laurent (Respire), Nadine Labaki (E Agora, Aonde Vamos); Nancy Meyers (Alguém Tem que Ceder), Samira Makhmalbaf (A Maçã); Suzana Amaral (A Hora da Estrela).